quarta-feira, 6 de junho de 2007

Minha geração no banco dos réus

Hoje fala-se das alteraçoes climáticas, desflorestamento, aumento do nivel das águas dos mares, nas próximas gerações de que se vai falar? Se hoje vivemos uma crise da ética ecológica, que viverão as gerações vindouras? Claro se o cenário não mudar elas vão herdar o silêncio, e lá estarémos nós, a geração culpada sem advogados de defesa a responder pelos crimes de desleixo e egoísmo. O silêncio vai ser a prova do crime, a falta de água potável, as temperaturas insuportáveis, inexistência da vegetação, o desaparecimento de espécies animais e vegetais serão testemunhas no processo e o juíz do da causa irá ler a senteça diante da nossa vergonha.

Ele irá informar o percurso da cumplicidade da nossa geração, a geração culpada, pois na década de 60, dizem os ambientalistas, os problemas ambientais eram percebidos como resultante de uma “crise de participação”. Na década de 70 passa a ser de uma “crise de sobrevivência”. A partir da década de 80, até aos nossos dias, a questão é marcada por aquilo que se considera como um sintoma de uma “crise cultural” ou “crise de civilização”. O juíz não vai poupar o facto de nós termos apoiado o antropocentrismo da idade moderna, baseado no postulado cartesiano, Penso logo existo, que relegava para o segundo plano as questões fora do homem. Bom ainda que com apelo da Antropologia Filófica, que sugere uma visão do tipo, Penso logo o outro existe, nós perdemos a oportunidade para superar a ética de valores materialistas e a racionalidade instrumental que construíram a Modernidade.

Nossa geração no banco dos réus irá ficar de boca aberta ainda que com lágrimas no rosto, pensamento e sentimento de arrependimento, será tarde. Aí sim, o juíz vai dar a palavra para auto defesa. Os mais teimosos irão procurar explicar o sucedido, dirão que foi herança doutros tempos que lhes antecederam, mas como o juíz do tribunal já me disse, numa das noites, ele vai perguntar porquê a minha geração ergueu casas nas barreiras, nas dunas primárias; porquê minha geração cortou e vendeu madeira sem reposição; porquê minha geração colocou indústrias poluidoras; vai perguntar aos jornalistas porque relegaram para o segundo plano a questão ambiental, porque no dia do debate sobre as mudanças climáticas um politico tinha algo a dizer a sociedade.

O advogado das gerações vindouras irá citar o livro de Génese, onde podemos ler: Deus disse: Façamos o ser humano à nossa imagem, à nossa semelhança, para que domine sobre os peixes do mar, sobre as aves do céu, sobre os animais domésticos e sobre todos os répteis que rastejam pela terra. E irá muito mais longe afirmando que ambientalistas como Lynn White, já diziam que se é verdade que o dualismo entre homem e natureza encontra seus fundamentos no cristianismo, não será menos verdade que a superação da desordem da terra implica não só mudanças nos paradigmas da ciência, como uma revisão na matriz dominante da teologia cristã. Foi o cristianismo na Idade Média que serviu o projecto da Modernidade, pois possibilitou a junção moderna entre a ciência e a tecnologia, e resultando são os riscos globais da crise ambiental presente na Actualidade.

Ele dirá que, o cristianismo, misturado muitas vezes com interesses imperialistas, moldou a pessoa humana como senhor e dono da natureza, ele manda, ordena e coordena, desde a idade média. Ele irá acusar a geração culpada de cumplicidade e negligência, pois ao aceitarmos os modus vivendi e operandi da modernidade, ignoramos o caminho para terra prometida, ignoramos religiões tradicionais, que concebem a natureza como uma forma de expressão do divino e lar dos deuses, o santuário da divindade criada para ser adorada e não destruída.

Irá questionar porque é que lemos o Gênesis na perpectiva egoísta do homem, que centra o domínio sobre todo o resto nele mesmo, e não lemos o livro sagrado como um mecanismo que estabelece amor entre a pessoa humana e os demais seres. Aí sim irémos baixar as cabeças e procurar refúgio na vergonha, no medo e entre os bancos que vão suportar durante o julgamento, os nossos espíritos vazios.

Quando chegar a vez da leitura da senteça, o tribunal irá ser assaltado por gritos de desespero, arrependimento tardio e as lágrimas de crocodilo vão inundar a sala do julgamento. Serémos atirados nas pucilgas como couve, cenouras e serémos devorados pelos porcos.

Os que vão testemunhar o julgamento e o nosso fim, não terão água para preparar o chá nas cerimónias, não terão flores naturais para depositar nas nossas campas. Eles vão viver do artificial, num mundo de altas temperaturas, não conhecerão a Jambila, Umbila, Chafuta, Jatrofa muito menos os Dungongos e outras especies animais.

Ainda vamos a tempo de mudar o cenário, recontruir o jardim do Éden a maneira contemporânea, aliás já dizia Martin Luther King que mesmo as noites totalmente sem estrelas podem anunciar a aurora de uma grande realização.

Feliz mês do Ambiente

Lázaro Bamo

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