terça-feira, 22 de novembro de 2011

OS MÁRTIRES DO NADA E OS HERÓIS DO HIPERURÂNEO

Aprendemos a voar como os pássaros,
A nadar como os peixes;
Mas não aprendemos a simples arte
De vivermos juntos como irmãos
(M. Luther King)

A minha convivência com muitos, independente da sua cor, religião, filiação político-partidária, é influenciada pelo facto de que esta diferença ser uma oportunidade para minha maturidade e crescimento. É por esta razão que os tolero, é por esta razão que os acolho e os acarinho. Esperava que nossas diferenças não fossem motivos para não-convivência, porém a cada dia que passa sinto que cresce em nós homens desta terra e outras, aquilo que dizemos combater, intolerância, falta de diálogo, desvalorização do outro e seus pensamentos, entre outras coisas, tendo como base o acesso ao poder.

Entendo e percebo que a vida e o tempo encarregam-se de fazer heróis e mártires para cada conjuntura, porém há um valor que se está a perder, que tem haver com a heroicidade como mérito proclamado pelos outros e não uma auto-proclamação e/ou insinuação de se estar correcto e por via disso, mártir ou herói. Não tarda que as pessoas apareçam a degolar-se umas as outras usando seus poderes materiais e sobrenaturais para se fazerem heróis.

Se esta atitude e postura continuarem estaremos a instituir ou a criar uma incubadora para o nascimento dos Mártires do Nada, aqueles que acho que não tem causas em suas lutas e batalhas senão a sua sobrevivência; aqueles que único motivo que os leva a estarem contra os sistemas e os governos do dia, é o acesso aos recursos e a riqueza; ser intolerante para com o governo dia somente para ter estatuto; degolar a personalidade das pessoas só para se afirmar que é o melhor; pisar os valores da convivência com os homens só para ser visto como o Herói do Hiperurâneo.
Há muitos riscos de instituir um poder num país com base na força, é que os heróis de hoje podem ser os diabos de amanha e assim sucessivamente. Há um abandono ao diálogo baseado no preconceito da diferença e desvalorização do outro enquanto ser diferente de nós. É que a lição vai passado, e nós iremos precisar deste valor que se chama diálogo quando chegarmos lá, quando estivermos lá (perguntem ao Paulo Portas), porém não quero com isso defender regimes totalitaristas e eternos no poder. Acho que devemos imprimir mudanças porém isto passa pela preparação de quem irá ser rei quando o rei for destituído do poder e se o sucessor não será mesma coisa ou pior que o rei; bom teríamos que experimentar para ter uma conclusão; porém pergunto: queremos experimentar e a quem vamos experimentar. Nunca pode ser o motivo da substituição de qualquer pessoa ou regime, o tempo que este tiver no poder, mas o seu nível de gestão e o desempenho deste no seu posto. Sim existem imperfeições e devem ser corrigidas, mas como devem ser corrigidas? Ninguém pensa no COMO, e as pessoas escondem sempre o como, pois interessadas pelo poder sabem que só querem ter acesso ao que seus adversários políticos tem. Citando Confúcio, gostaria de lembrar que, “Quem quiser governar bem um país, deve primeiro governar a sua cidade. Quem quiser governar bem a sua cidade, deve aprender a governar primeiro a sua família; e quem quiser governar bem a sua família deve aprender primeiro a governar bem a si próprio”.
Os mártires do nada e os heróis do hiperurâneo usam a mesma táctica que dizem ser do seu inimigo, e culpam sempre os outros pelos seus fracassos. Da mesma forma que acusam este ou aquele de nepotismo e amiguismo, eles serão julgados e condenados por ter esta postura no futuro; eles hoje estão unidos pela não-Causa (considero não-Causa a falta/ausência desta ou a não definição clara desta) e já existe entre eles aquele que será venerado como o clarividente, já existem entre eles os ministros, governadores, até secretárias; já existe uma ideia de como serão suas casas e seus carros; de como será a educação dos seus filhos; que carro para suas esposas; que casas para suas amantes; que terra para privatizar; quem será PCA daqui e dali; qual será a nova constituição; isto tudo para excluir as pessoas tendo em conta as necessidades e desejos do novo grupo, da nova elite; e porque esta elite terá chegado ao poder à força vai tratar de fechar todas vias que terá usado para chegar ao poder para que seu regime não seja ameaçado; terá também que investir muito na segurança e nos seguranças, para que seu regime não seja ameaçado. Depois terão que pagar aos seus aliados, entregando parte da nossa terra e seus recursos.

Será que vale a pena? Sim tudo vale a pena quando a alma não é pequena, precisamos de ousadia para que haja mudanças e o poder também conquista-se, como conquistou Paulo Portas em Portugal; conquista-se como Lula da Silva conquistou no Brasil; conquista como Nelson Mandela na RSA; conquista-se como Guebuza conquistou em Moçambique, porém regimes que violaram os direitos humanos para chegar ao poder acabam caindo na desgraça como aquela dos malogrados Nino Vieira e Muamar Kadaffi, só para citar alguns exemplos.

É preciso saber que mesmo com a limitação nas liberdades fundamentais do homem, Samora Machel, conseguiu criar homem novo e hoje ele é exaltado como o ícone da Primeira República se quisermos parafrasear o grande Filósofo Severino Ngoenha. Quer isto dizer que ninguém pode falar em nome do povo sem mandato para o efeito, sob risco de ser considerado boateiro, pois virou moda, qualquer um aparecer e dizer o Povo, o Povo. Quem exalta Samora é o povo, que anda no chapa e bebe nos famosos senta baixo. Já devíamos ter aprendido que ninguém manda muito menos manipula o povo. Guebuza tem mandato para falar de quem o delegou competências para o efeito, neste caso o povo moçambicano, sem querer dizer que não podemos analisar o país e dai tirar nossas ilações, mas quando o povo estiver cansado até muitos que falam em nome deste irão fugir do país, tenho certeza.

Uma ordem de sucessão no poder baseado na força tem impactos negativos e se hoje os nossos países investem na segurança é por uma questão de maturidade, aliás a wikileaks veio a provar o quanto a questão de segurança é importante para qualquer país do mundo e pior quando se fala de países desenvolvidos, e aqui há muito investimento para que os países e os regimes se mantenham, e isto será assim para sempre por motivos óbvios.

A nossa causa só poderá ter virtude se ela responder as perguntas: O que? Porque? Como? Caso contrário melhor é poupar-nos. Aventurem sozinhos mártires do nada e heróis do hiperurâneo.

Lazaro Bamo
Nampula – Ribáue

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